Levantamento inédito mostra que 72% dos síndicos paulistanos se reelegem. Os relatos de quem está no poder há mais de dez anos ajudam a entender por quê síndico para sempre.
Eles fazem parte do dia a dia de um em cada três paulistanos. Cerca de 20 mil síndicos zelam pela ordem e pela convivência harmônica entre os 2,9 milhões de pessoas que, segundo dados do Secovi, habitam edifícios residenciais na capital. A maioria deles exerce a função por vários mandatos. Segundo um levantamento realizado pela Lello, a maior administradora de condomínios do estado, 42% estão no cargo há mais de seis anos. Outros 30% administram o prédio há pelo menos quatro. E há quem passe mais de uma década na função.
Affonso Celso de Oliveira, de 64 anos, está à frente do maior condomínio residencial da América Latina, o Edifício Copan, há 16. “Cheguei por acidente”, diz o senhor de frases curtas e diretas. “No começo, era uma verdadeira zona. Hoje é tudo mais sossegado.” Morador desde 1963, antes mesmo de o prédio ser inaugurado oficialmente (o que só ocorreu três anos depois), o carioca de nascimento foi viver no Centro da cidade para ficar perto da Fundação Getúlio Vargas, onde estudava. Nessa época, a maioria dos habitantes do prédio era de homens desquitados (ainda não existia o divórcio legal) e de alunos do Mackenzie, da USP e da FGV. Conhecido como “Seu Affonso”, o síndico diz que decidiu assumir o cargo movido pelo idealismo. Em 1991, o Copan era um edifício caótico, onde reinava o descaso. “Junto com outros moradores, desenhei um projeto de reestruturação, derrubamos o síndico e elegemos um novo.” Um ano depois, Affonso assumiu o posto. “Era para ser somente por dois anos, mas gostei da coisa.”
Um dos fatores que o motivaram a renovar o mandato foi o desafio de tocar um edifício com dimensões de uma cidade do interior. Cinco mil pessoas povoam os 1.160 apartamentos, servidos por 20 elevadores. A ala comercial, também supervisionada por Affonso, abriga 72 lojas e um antigo cinema, desativado. Ele ainda coordena o trabalho de 99 funcionários, que, entre outras tarefas, limpam 22 mil metros quadrados por dia e distribuem 3 mil cartas. Há 17 anos, Affonso se dedica integralmente à administração do prédio e, raridade nesse mercado, recebe por isso. “Não digo quanto, mas ganho muito bem.”
Segundo a Lello, apenas 4% dos síndicos paulistanos têm função remunerada. A maioria (61%) recebe apenas isenção da taxa mensal do condomínio. Os outros 35% não contam com nenhum tipo de benefício, trabalhando voluntariamente. A complexidade da tarefa, aliada à falta de incentivos financeiros, ajuda a explicar outro fator por trás da contínua renovação dos mandatos: a carência de novos candidatos. “Os moradores de edifícios em São Paulo relutam em se candidatar a síndico, pois sabem que a função é espinhosa”, afirma Angélica Arbex, coordenora da pesquisa. Uma boa medida do desinteresse pela atividade é a baixa participação dos moradores nas reuniões de condomínio. Rene Vavassori, diretor da Administradora Itambé, diz que o índice médio de frequência é entre 20% e 25%. No entanto, engana-se quem imagina que o cargo seja ocupado principalmente por aposentados. “Os síndicos de hoje são pessoas mais jovens e bem informadas”, afirma Vavassori. A pesquisa da Lello confirma: 51% dos síndicos paulistanos têm entre 30 e 50 anos.
Paulo Sérgio Barbosa, microempresário de 43 anos, é um deles. Barbosa gerencia os 120 apartamentos do Condomínio Lupus, na Vila Mariana, há 12 anos. Ele afirma que um dos segredos para se manter no cargo é saber conversar. “Gosto de falar com as pessoas, de manter uma postura amigável. Mas nem todo mundo sabe separar a figura do amigo da do síndico.” Barbosa diz que perdeu uma amizade após mandar o apartamento de um morador inadimplente para a penhora. “Tive de agir de acordo com o que é certo. Paciência”, diz. Affonso, do Copan, afirma que a diplomacia tem limites: “Gosto de tomar um café e dialogar, mas há pessoas que não aceitam. Nesses casos, sou obrigado a tomar decisões mais radicais”. Uma delas é pedir a saída de condôminos. Em toda a sua gestão, teve de expulsar cerca de 50 moradores – entre eles, dois proprietários – que não respeitavam as normas. “Síndico tem que ter pulso.”
Pulso é o que não falta a Ângela Regis, dona de casa de 56 anos, síndica do Condomínio Edifício Metro, na Rua São João, há 17 anos. O condomínio misto, composto por duas torres, tem 208 unidades, entre apartamentos, conjuntos comerciais e lojas. “Eu combato tudo com multa. Aqui, as pessoas não sabem morar nem trabalhar em prédio, então, para manter a ordem, tenho que ensiná-las a se comportar.” Ângela não liga para os apelidos de “sargento” e “general”. “Os condôminos tentam me desrespeitar. Não entendem que tudo o que faço é em prol dos edifícios, com amor. Não é à toa que estou no comando desde 1992, né?”
fonte: http://revistaepocasp.globo.com/Revista/Epoca/SP/0,,EMI74954-16206,00-HISTORIAS+DE+SINDICOS+PAULISTANOS.html
